A incerteza é o novo normal? É tentador pensar assim depois de mais um ano tumultuado, marcado pela persistência da covid-19, a disrupção na cadeia de suprimentos e a escassez de chips – que causou forte impacto na oferta de eletrônicos e outros bens de consumo. A guerra na Europa Oriental acrescentou mais imprevisibilidade às nossas previsões, e a Rússia acabou fora da nossa Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia 2022-2026.
No entanto, há aspectos positivos no estudo deste ano. Após uma queda anual de 2,3% em 2020, a receita global total de entretenimento e mídia (E&M) se recuperou fortemente, registrando um aumento de 10,4% em 2021, passando de US$ 2,12 trilhões para US$ 2,34 trilhões. Espera-se para 2022 uma recuperação sustentada, com um aumento anual de 7,3% – o que significa uma volta à tendência de crescimento de receita. Uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 4,6% até 2026 elevará a receita global de E&M para US$ 2,93 trilhões.
A publicidade na internet permanece como o principal – e único – impulsionador da recuperação na área da publicidade. Para se ter uma noção do volume, em 2021, o valor do mercado de publicidade na internet dos Estados Unidos (US$ 189,3 bilhões) foi quase US$ 40 bilhões a mais do que a receita total global de publicidade em TV aberta naquele ano. Até 2026, esperamos que a receita de publicidade na internet nos Estados Unidos fique apenas US$ 8 bilhões abaixo da receita global total de publicidade não digital. Esse crescimento notável abalou o equilíbrio entre as receitas publicitárias, de consumo e de acesso.
Outros destaques positivos no segmento de publicidade na internet incluem aplicativos móveis, fundamentais para o crescimento do consumo de mídia móvel e da receita de anúncios associada. O crescimento da receita de publicidade na TV continuará à medida que mais emissoras aumentarem a ênfase em suas ofertas de aplicativos de vídeo OTT (over-the-top) e lançarem novos serviços de vídeos sob demanda baseados em anúncios (AVOD, na sigla em inglês), em paralelo a mais serviços de vídeo baseados em assinatura se voltando para modelos de negócios híbridos em busca de lucratividade. Por outro lado, a publicidade não digital terá apenas um crescimento anual de 1,5% até 2026 e entrará em declínio a partir de 2025, após se recuperar moderadamente dos impactos da covid-19.
Em meio a boas notícias, alguns pontos merecem atenção. A receita de publicidade na internet não está distribuída uniformemente. Apenas um quarto da receita líquida fora da China continental não passa pelo Google ou pela Meta antes de chegar aos editores. Pesos-pesados como a Amazon recebem uma parte considerável dos gastos restantes. O domínio das grandes empresas de tecnologia está levando a um aumento do controle regulatório em todo o mundo e futuras regulamentações ainda podem afetar as previsões. Mas, por enquanto, o crescimento da publicidade na internet é um fenômeno que elevará a receita total de publicidade acima de US$ 1 trilhão em 2026 – e a receita total de E&M a novos patamares.
Como reflexo da transição geral do consumidor para o consumo digital, a realidade aumentada, a realidade virtual e o eSports continuam a crescer, enquanto jogos físicos, downloads de música e ringtones perdem espaço. A receita do consumidor de realidade aumentada móvel terá o aumento mais rápido – de 39,1%, nos próximos cinco anos – à medida que a tecnologia for cada vez mais incorporada a aplicativos, sejam eles de jogos ou não.
A segunda linha de receita de crescimento mais rápido, a venda de ingressos para consumidores eletrônicos, foi fortemente afetada pelo impacto que a covid-19 teve sobre eventos ao vivo. Os jogos de realidade virtual, terceiro segmento de crescimento mais rápido, enfrentam o típico problema “quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha?”. Isso porque os desenvolvedores de jogos têm receio de investir pesadamente em realidade virtual até que os headsets sejam amplamente adotados pelos consumidores, que por sua vez relutam em comprar headsets até que um conteúdo melhor esteja acessível.
A atividade de fusões e aquisições está aumentando no setor de games, incluindo o anúncio da aquisição recorde da Activision Blizzard pela Microsoft, por US$ 68,7 bilhões, em janeiro de 2022. A Sony adquiriu cinco estúdios de videogame em 2021, incluindo Bluepoint e Valkyrie Entertainment. A empresa manteve sua atividade de fusões e aquisições em 2022, com a aquisição, por US$ 3,6 bilhões, da Bungie, desenvolvedora por trás de Halo e Destiny, e da Haven Studios, que ajudou a desenvolver Assassin's Creed. Fora dos Estados Unidos, a ByteDance, proprietária da TikTok/Douyin, anunciou que iria adquirir o estúdio de games chinês Moonton, o desenvolvedor por trás de Mobile Legends: Bang Bang.
A China continental foi responsável por 17,1% da receita global de E&M em 2021. Embora os Estados Unidos continuem sendo, de longe, o maior mercado de entretenimento e mídia durante o período de nossa previsão, a China continental deve ultrapassar os Estados Unidos em vários segmentos importantes. Em 2021, a China continental tomou dos Estados Unidos o posto de maior consumidor mundial de dados, com 804,4 mil petabytes. Quase um terço desse consumo ocorre em redes celulares, em contraste com o país norte-americano, onde apenas 4,3% do consumo de dados acontecem por redes 4G e 5G. Os Estados Unidos também perderão sua liderança no subsegmento móvel de realidade aumentada, à medida que os jogos móveis com essa tecnologia decolarem na China continental devido ao forte investimento de gigantes locais, como Huawei e Tencent. Por fim, a China continental ultrapassou os Estados Unidos e se tornou o maior mercado de cinema em 2020. O país deve superar os níveis pré-pandêmicos em 2023, apesar da recuperação pós-covid nos Estados Unidos.
A pandemia da covid-19 acelerou a transição para o digital nos mercados de todo o mundo, com os consumidores considerando, cada vez mais, o acesso à internet de alta velocidade como algo essencial, e não um luxo.
Mercado global de acesso à internet por participação na receita (%), de 2021 a 2026
Fonte: Global Entertainment and Media Outlook 2022-2026, PwC, Omdia
As receitas globais totais de informações B2B em 2021 praticamente voltaram aos níveis pré-pandemia. A demanda por informações de missão crítica B2B se manteve alta em meio à incerteza da pandemia.
As perdas causadas pela pandemia de 2020 serão revertidas e o segmento da indústria cinematográfica atingirá novos patamares em 2023. A receita de bilheteria deve chegar a US$ 49,4 bilhões em 2026, com CAGR de 18,9% desde 2021.
A pandemia mudou permanentemente as taxas globais de consumo de dados e tornou o acesso à internet uma utilidade essencial, e não mais um luxo. Com o wi-fi como tecnologia de rede dominante e o vídeo como a maior categoria de conteúdo, o consumo global de dados deve crescer 26% ao ano e atingir 8,1 milhões de petabytes em 2026.
O mercado de games sociais e casuais crescerá e o de games tradicionais se contrairá. O principal mercado mundial de videogames e eSports, a Ásia-Pacífico, continuará a se expandir, embora não tão rápido quanto a América Latina.
A previsão é que o segmento de videogames e eSports cresça a um CAGR de 8,5%, chegando a US$ 323,5 bilhões em 2026. A maior parte desse crescimento será proveniente de games sociais/casuais. No mesmo período, a receita dos games tradicionais cairá, à medida que o foco mudar de games de console e PC para dispositivos móveis.
Embora o segmento tenha se recuperado ligeiramente dos impactos da covid-19 em 2021, a falta de uma forte retomada reflete a transição contínua de leitores e anunciantes para plataformas digitais – um mercado dominado por Google (da Alphabet), Facebook (da Meta) e Amazon.
Embora as receitas digitais estejam crescendo, elas não compensarão o declínio das receitas impressas. A venda global total de jornais impressos cairá de 451 milhões, por dia, em 2021, para 411 milhões em 2026, à medida que leitores e anunciantes buscam outros meios de comunicação para gastar seu tempo e dinheiro.
A Índia continua a ser uma exceção em termos de leitores de jornais e ultrapassará a China, tornando-se o maior mercado mundial de leitores de jornais impressos em 2025. Será também o único mercado a apresentar crescimento nas vendas de unidades impressas e na receita de circulação de jornais impressos.
No mercado de revistas de consumo, a receita de publicidade digital ultrapassará a impressa em 2026. Na indústria de jornais, esse mesmo ponto de inflexão não ocorrerá durante o período de nossa previsão. A impressão representará quase dois terços da receita de publicidade em 2026.
A reabertura das livrarias interrompeu o aumento no consumo de livros digitais causado pela pandemia, mas o segmento de livros permanece resiliente. A receita global deve crescer a uma taxa anual de 1,2% durante o período da nossa previsão e chegar a US$ 74 bilhões em 2026.
Os Estados Unidos continuam sendo o maior mercado consumidor de livros do mundo e vão contra a tendência global: lá a receita de livros impressos cresce mais rapidamente do que a dos digitais. A região da Europa, Oriente Médio e África (EMEA) – o maior mercado regional – será a única a encolher durante o período da nossa previsão. China, Índia e Quênia são os mercados de crescimento mais rápido no segmento. Hong Kong, Noruega e Tailândia apresentam declínio mais rápido.
Os principais impulsionadores de vendas de livros ao consumidor incluem autores de renome, política, eventos, televisão e cinema. As mídias sociais, incluindo TikTok e Instagram, também influenciam.
As perspectivas para o mercado global de publicidade de mídia exterior (OOH, na sigla em inglês) são positivas, à medida que a vacinação contra a covid-19 se amplia e a doença parece se tornar mais gerenciável. Um padrão de aumento de gastos com mídia exterior nos meses de primavera e verão, quando as taxas de infecção são mais baixas, ajudou a preservar parcialmente o mercado de mídia exterior de danos mais graves na receita.
O setor de mídia exterior atingirá um recorde de US$ 38,5 bilhões em 2022, após a forte contração de 2020, quando as restrições impostas pela covid-19 reduziram o tempo gasto pelas pessoas ao ar livre nos centros das cidades e no transporte.
O crescimento da receita física de mídia exterior, que já passava por uma desaceleração antes da pandemia, começará a se contrair em 2025, após uma elevação pós-crise.
As marcas continuam a se voltar em direção a campanhas digitais com base em programação, que oferecem melhores recursos de segmentação e gastos com anúncios mais eficientes. As receitas digitais de mídia exterior vão se desacelerar após uma recuperação pós-pandêmica, mas continuarão a aumentar durante o período da nossa previsão.
Regionalmente, o setor de mídia exterior refletirá a tendência mais ampla de ver a China ultrapassar os Estados Unidos. Isso ocorrerá em 2024. Até 2026, a China responderá por 25,4% dos gastos globais em mídia exterior.
Atingido duramente pela pandemia da covid-19, o setor global de música ao vivo experimentou uma leve recuperação em 2021 com o relaxamento dos lockdowns, mas deve superar os níveis pré-pandêmicos apenas em 2024. Até 2026, o segmento do mercado de música deverá alcançar US$ 31,2 bilhões.
A América do Norte continua sendo o maior mercado de música do mundo, com 42,9% das receitas em 2026. Espera-se que a América Latina seja a região a apresentar crescimento mais rápido, embora a partir de uma base de receita de música muito menor.
A audiência global de podcast continuará a crescer, aumentando de 895 milhões em 2019 para mais de 1,5 bilhão em 2026. As receitas de podcast acompanharão esse crescimento e ultrapassarão a marca de US$ 3 bilhões em 2025, antes de atingir US$ 3,3 bilhões no fim do período de nossa previsão.
Embora a receita total de rádio esteja aumentando, o crescimento é muito mais lento do que a receita de publicidade em podcast. A receita de rádio totalizará US$ 45 bilhões em 2026, aumentando a um CAGR de 1,5% durante o período de nossa previsão.
A publicidade na internet é o formato de publicidade dominante no mundo. Seu crescimento dinâmico está exercendo um impacto crescente no espaço de publicidade da mídia em geral, uma vez que anunciantes e consumidores direcionam seus gastos e sua atenção para os canais on-line.
O celular continua sendo o maior gerador de receita de publicidade na internet em termos de formato, com valor estimado de US$ 532,3 bilhões até 2026.
Os gigantes da tecnologia que dominam o mercado global de publicidade na internet estão, em grande parte, sediados nos Estados Unidos. O país, portanto, continuará a ser o maior mercado individual durante o período de nossa previsão.
A Ásia-Pacífico avançará em relação à América do Norte como maior mercado regional de publicidade na internet. A diferença entre as duas regiões cairá de US$ 38,6 bilhões em 2021 para US$ 18,6 bilhões em 2026, graças ao domínio do mercado chinês e ao crescimento dinâmico nos mercados emergentes, como Índia e Indonésia.
O segmento de publicidade na TV continuará a crescer em 2022. Tanto a publicidade na TV terrestre quanto a na TV multicanal vão recuperar as perdas da pandemia e terminarão o ano com receita de US$ 164,3 bilhões – acima dos níveis de 2019.
Continuando sua expansão em direção ao mercado de massa, graças a melhorias em hardware, software e conteúdo, os gastos globais com RV devem aumentar a um CAGR de 24,1% durante o período da nossa previsão, chegando a US$ 7,6 bilhões. O mercado de RA, impulsionado pela pandemia, atingiu US$ 18,9 bilhões em 2021.
Após o sucesso do Meta Quest 2, os gigantes da tecnologia e os fabricantes de hardware provavelmente entrarão no mercado de realidade virtual, ou voltarão a ele, ampliando as opções de headsets e plataformas para os consumidores.
O mercado de jogos RV é a principal fonte para a receita total do segmento, respondendo por US$ 1,9 bilhão em 2021 e aumentando para US$ 6,5 bilhões em 2026. A receita de conteúdo de vídeo RV também aumentará de US$ 690 milhões para US$ 1,1 bilhão durante o período de nossa previsão.
Os Estados Unidos são o maior mercado de RA móvel no mundo, com receita de US$ 7,9 bilhões em 2021. No entanto, o crescimento mais rápido da China continental durante o período da nossa previsão fará com que o país ultrapasse os Estados Unidos e se torne o maior mercado de RA móvel do mundo em 2025.
O mercado global de TV por assinatura continuará a se contrair durante o período de nossa previsão, enfrentando a concorrência de alternativas e plataformas SVOD (como Netflix) mais baratas e não integradas, que combinam TV de baixo custo com fornecimento de dados.
O número de domicílios no mundo com TV por assinatura cairá de 869 milhões em 2021 para 861 milhões em 2026. A maior parte das perdas ocorrerá em mercados onde a TV paga tradicional é muito mais cara que SVOD ou IPTV (sinal de TV transmitido pela internet).
Após cinco anos de perdas significativas e impactos relacionados à pandemia em lojas físicas, o home vídeo físico ainda está em forte queda. Muitos varejistas provavelmente estão parando de estocar mídia física e reduzindo ainda mais o acesso a esse segmento no mercado de gastos casuais.
A receita total de TV tradicional deve chegar a US$ 222,1 bilhões no final do período da nossa previsão. A receita de TV paga representará a maior fatia, com 83,2%, e o home vídeo físico representará apenas 2%.
Embora o licenciamento deva continuar a ser a principal fonte de financiamento para a radiodifusão pública em alguns mercados, a prática é vista, cada vez mais, como ultrapassada, levando os governos a explorar outros meios de financiamento. Em 2026, a receita da taxa de licença pública representará 14,8% da receita total da TV tradicional.
Variantes da covid-19, lockdowns periódicos, preocupações dos consumidores e um “retorno ao normal” mais lento do que o esperado contribuíram para um forte crescimento de receita – 22,8% – no mercado de vídeo OTT. Em 2020, o segmento alcançou um pico de crescimento de 35,4%.
Em grande parte do mundo, as implicações da pandemia impulsionaram a indústria de vídeo OTT e a colocaram anos à frente.
Embora o TVOD (Transactional Video on Demand, em que o usuário paga por conteúdo assistido, como no iTunes) tenha tido um bom desempenho em 2020 e 2021, o SVOD (Subscription Video on Demand, pelo qual o usuário assina um pacote mensal para ter acesso a todos os conteúdos disponíveis, como no Netflix) continuará respondendo pela maior parte do crescimento da receita no segmento de vídeo OTT. O TVOD experimentará um ano de crescimento negativo em 2022, devido principalmente a uma reversão das mudanças nas janelas de lançamentos de cinema nos Estados Unidos.
Os Estados Unidos são o maior mercado de TVOD no mundo e permanecerão assim durante o período de nossa previsão, apesar do crescimento mais rápido da Ásia-Pacífico. Nessa região, a China desponta como maior mercado único de vídeo OTT e deve ser o país que mais contribuirá para o crescimento nos próximos cinco anos.
Em relação à receita total de vídeo OTT, a América Latina dobrará de tamanho no período de nossa previsão, passando de US$ 2,5 bilhões em 2021 para US$ 4,6 bilhões em 2026, apesar de ser a menor região global. A Ásia-Pacífico é o segundo mercado de vídeo OTT e alcançará crescimento mais rápido até 2026, seguido de Europa, Oriente Médio e África (EMEA) e América do Norte.
Sócio e líder do setor de tecnologia, mídia e telecomunicações, PwC Brasil
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