A confiança é essencial tanto para os consumidores quanto para as empresas que vendem produtos e serviços. Diante de crises financeiras, ambientais e tecnológicas que se sobrepõem e se reforçam, os consumidores estão priorizando a segurança e a confiabilidade das marcas com as quais interagem.
Essa é uma constatação importante da primeira edição da pesquisa Voz do Consumidor, que se baseia em insights acumulados ao longo de 15 anos de estudos sobre consumo. A pesquisa coletou opiniões de mais de 20 mil consumidores em 31 países (entre eles, o Brasil) sobre uma ampla gama de questões, como cuidados com o meio ambiente, atenção à saúde, transparência de dados, relação custo-benefício e adoção da inteligência artificial (IA).
A boa notícia para os líderes de empresas de consumo é que o mercado global continuará a se expandir. A má notícia é que há um crescente descompasso entre a percepção dos executivos sobre a confiança dos consumidores nas empresas e a confiança que eles efetivamente têm. Para manter e aumentar sua participação no mercado, as empresas precisam descobrir como aumentar sua credibilidade em várias dimensões.
Luciana Medeiros, sócia e líder de Consumo e Varejo
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Um percentual surpreendente de 94% dos entrevistados no Brasil (85% no mundo) relata sentir os efeitos das mudanças climáticas em seu dia a dia. Uma parcela menor, mas ainda significativa (47% no Brasil e 46% no mundo), afirma que está comprando mais produtos sustentáveis para reduzir seu impacto pessoal no meio ambiente.
Essa lacuna representa uma oportunidade para as empresas de produtos de consumo se conectarem melhor com os consumidores preocupados com o meio ambiente. Também exige uma compreensão mais profunda do comportamento do cliente. Globalmente, os consumidores dizem estar dispostos a pagar 9,7% mais que o preço médio dos produtos, desde que fabricados ou obtidos de forma sustentável.
A expectativa de que as empresas ajam de forma correta em prol do meio ambiente agora é vista como o comportamento mínimo necessário. É preciso, portanto, alcançar um equilíbrio delicado entre preço acessível para o consumidor e impacto ambiental.
Mais da metade dos consumidores (56% no Brasil; 52% no mundo) têm a intenção de aumentar o consumo de frutas e vegetais frescos, enquanto um grupo menor, mas importante (20% no Brasil; 22% no mundo), planeja reduzir o consumo de carne vermelha. Apesar dessas preferências com foco em saúde, apenas 19% dos consumidores no Brasil e no mundo consideram as implicações ambientais de suas escolhas alimentares. É uma oportunidade importante para produtores de alimentos, varejistas e atacadistas, preencherem a lacuna entre a intenção do consumidor e a prática sustentável.
Os consumidores têm sentimentos contraditórios em relação às mídias sociais. Eles as utilizam cada vez mais para compras: 49% dos brasileiros (46% no mundo) dizem comprar produtos diretamente pelas mídias sociais, um aumento significativo em comparação aos 21% registrados globalmente em 2019. Além disso, as mídias sociais são populares para descoberta e avaliações: 78% dos brasileiros (67% no mundo) usam esses canais para descobrir novas marcas e 80% (70% no mundo) buscam avaliações para validar uma empresa antes de realizar uma compra. Ao mesmo tempo, no entanto, os consumidores questionam a segurança e a confiabilidade das mídias sociais, classificando-as como o setor de atividade menos confiável.
Encontrar o equilíbrio certo nas mídias sociais é crucial para as empresas. As marcas precisam criar conteúdo envolvente e autêntico que capture a atenção do seu público-alvo, mas também devem considerar as preocupações dos consumidores com a questão da confiança. A proteção de dados e a qualidade dos bens e serviços são os principais fatores que influenciam a confiança dos consumidores brasileiros – 90% de citações como aspectos de alta importância, em comparação com 83% e 79% no mundo, respectivamente.
Com abordagens personalizadas, iniciativas de conteúdo gerado pelo usuário, gamificação e outras estratégias, as empresas estão competindo no espaço digital para criar relacionamentos que vão além da mera conscientização da marca. O impacto dos anúncios personalizados nas mídias sociais é evidente: 81% dos consumidores brasileiros (72% no mundo) afirmam que essas peças influenciam suas decisões de compra.
A maioria dos consumidores (90% no Brasil e 83% no mundo) afirma que a proteção de seus dados pessoais é um dos fatores mais cruciais para que as empresas conquistem confiança. Quando perguntados especificamente sobre privacidade, 86% dos brasileiros (80% no mundo) exigem garantias de que suas informações pessoais não serão compartilhadas. No entanto, apenas 59% (54% no mundo) dizem entender bem como seus dados são armazenados e compartilhados. Ao mesmo tempo, 85% (71% no mundo) expressam preocupações sobre a segurança de seus dados pessoais nas mídias sociais.
Com a concorrência por dados valiosos aumentando e novas regulamentações entrando em vigor na União Europeia e em vários países da Ásia-Pacífico, é essencial que as empresas implementem fortes medidas de proteção de dados e desenvolvam estratégias para envolver os consumidores de maneira ética.
Executivos do setor descrevem o surgimento de um novo contrato social no qual os consumidores compartilham voluntariamente suas informações pessoais em troca de incentivos, como promoções, exclusividades e outras vantagens. De fato, cerca de metade dos consumidores no Brasil e no mundo se diz satisfeita com o uso de seus dados para oferecer serviços e experiências personalizadas.
Para os consumidores, a inflação é, de longe, o principal risco que pode afetar seus países no próximo ano: quase dois terços a colocam entre suas três principais preocupações. Após aceitarem os aumentos de preços durante a pandemia de covid-19, os consumidores mostram pouca tolerância a novos aumentos, especialmente porque estão focando em gastos essenciais crescentes: 69% dos consumidores no Brasil (62% no mundo) esperam que o principal aumento em seus gastos nos próximos seis meses seja com alimentos.
Diante das reações dos consumidores e legisladores aos aumentos de preços, as empresas precisam tomar outras medidas não apenas para gerenciar preços, mas também para proteger suas finanças e tranquilizar os investidores.
Marcas e varejistas precisam adotar uma estratégia omnichannel mais flexível para atender às expectativas crescentes dos consumidores por uma combinação dinâmica de experiências on-line e off-line. Para algumas empresas, ampliar recursos para oferecer uma experiência homogênea e personalizada, independentemente da plataforma ou localização, é uma fonte de vantagem competitiva. Muitos executivos destacaram a importância de capacitar suas equipes de vendas com acesso a dados mais personalizados dos consumidores e oferecer serviços e experiências mais relevantes nas lojas físicas.
No Brasil, a presença física nas lojas ainda tem importância significativa, mas a preferência dos consumidores se desloca mais para os canais on-line: 51% usam mecanismos de busca para descobrir produtos e 66% para pesquisar mais informações ou comparar itens, enquanto 46% recorrem às compras on-line.
As empresas enfrentam o desafio de alinhar as percepções dos consumidores em relação a tecnologias emergentes, como a IA generativa, e com o que essas tecnologias realmente podem fazer agora e no futuro. Atualmente, mais de 80% dos consumidores no Brasil e no mundo estão preocupados com os avanços futuros da IA generativa.
Mais da metade dos consumidores confia na IA generativa para tarefas simples, como agregar informações sobre produtos ou fornecer recomendações. No entanto, eles estão menos confiantes em seu uso para serviços mais pessoais e arriscados, como assistência à saúde. Isso significa que as empresas devem ser cuidadosas ao adotar essas tecnologias para reduzir custos operacionais, abordando as preocupações dos consumidores e mantendo altos padrões éticos.
Apesar do grande interesse dos entrevistados no uso de chatbots para fornecer respostas detalhadas (42% no Brasil e no mundo) e resolver problemas complexos (54% no Brasil e 44% no mundo), quase metade dos consumidores (47% no Brasil e 49% no mundo) quer fazer conexão direta com um representante de vendas se o chatbot não conseguir responder à consulta de forma eficaz. Isso, mais uma vez, destaca o equilíbrio que as empresas precisam alcançar entre inovação tecnológica e o toque humano.
Sócio e líder de Consultoria tributária em Consumo e Varejo, PwC Brasil
Tel: 4004 8000