Mercado da maioria

Como a força da população de baixa renda está transformando o setor de varejo e consumo no Brasil

Dividida entre as classes C, D e E, a base da pirâmide social brasileira representa 76% da população e responde por quase metade do consumo do país. Após enfrentar os impactos da pandemia de covid-19, que acelerou a digitização e transformou comportamentos de consumo, esses brasileiros emergem com novas expectativas e hábitos.

Diante desse cenário, surge uma pergunta crucial: será que as empresas de varejo e bens de consumo estão preparadas para compreender e atender de forma eficaz essa população, que tem novos comportamentos, preferências e expectativas?

Neste estudo, mergulhamos no universo do mercado da maioria, entendendo os hábitos e desejos da população das classes C, D e E no país, com base em uma pesquisa realizada com mais de 2.300 pessoas e em entrevistas em vídeo com lideranças de grandes empresas dos segmentos de varejo e consumo.

O relatório traz também insights valiosos e estratégias para que as empresas se preparem e coloquem ações em prática. Além de apontar os cinco fatores que devem ditar as transformações do setor de varejo e consumo no país, agora e no futuro, apresentamos um roteiro estratégico para varejistas focados no mercado da maioria.


Destaques desta edição

O mercado da maioria e os significados do consumo

O consumo para o mercado da maioria é encarado como uma questão de conquista e esforço individual:


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se esforçam para comprar coisas que não tiveram condições financeiras de ter quando eram mais jovens.

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se sentem realizados quando economizam para comprar um produto e conseguem.

Consumidor além do preço: uma nova matemática do consumo

O desejo por compras inteligentes que aliem preço, qualidade, praticidade e conforto é uma característica da maioria:


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valorizam produtos de qualidade por preço justo.

O policonsumidor: reinventando a experiência de compra

A imersão no mundo phygital já faz parte do cotidiano do mercado da maioria:


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já compraram on-line e fizeram a retirada em lojas físicas.

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declaram depender mais da internet para comprar produtos e serviços do que há dez anos.

 

A maioria prefere vitrines mais chamativas, coloridas e com muitas informações e se sente mais à vontade em lojas com funcionários com perfis mais parecidos com o seu.

Preferem vitrines mais chamativas

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gostariam de ter eletrônicos e eletrodomésticos mais modernos do que têm atualmente.

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consumiriam mais se tivessem mais acesso a crédito.

Um consumidor com propósito: engajamento e coletivização das preferências de consumo

A ideia de que as classes C, D e E não se preocupam com o consumo consciente e sustentável é um mito. Esse público demonstra disposição semelhante à das classes A e B de priorizar essas pautas e evitar marcas que não estão alinhadas com esses temas:


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já compraram on-line e fizeram a retirada em lojas físicas.

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já deixaram de comprar marcas por falta de responsabilidade social.

Um consumidor da verdade: o poder das conexões autênticas

Há uma demanda latente por consumir de marcas/lojas que estejam engajadas na promoção e no fomento da diversidade:


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aceitam pagar um pouco mais por marcas/produtos que apoiem a diversidade.

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já deixaram de comprar um produto ou contratar serviços de alguma marca que teve atitudes consideradas preconceituosas.

Um consumidor investidor: a nova arena circular do consumo

A busca por métodos alternativos de compra, que favorecem a otimização do consumo, já é uma tendência observada no mercado da maioria.


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já comparam produtos usados em sites/apps especializados.

Cinco tendências para transformação do setor de varejo e consumo no Brasil

Conheça alguns aspectos das cinco tendências relevantes para os segmentos de varejo e bens de consumo no contexto atual do Brasil.

1. Consumidor além do preço: uma nova matemática do consumo

  • O mercado da maioria está fazendo uma avaliação mais detalhada do custo-benefício dos produtos e serviços. Eles não consideram apenas o preço, mas analisam também profundamente a qualidade e a reputação da marca antes de tomar uma decisão de compra.
  • Na nova equação custo-benefício, outros fatores, como a experiência de compra e a praticidade, ganham força nas escolhas dos consumidores das classes C, D e E. No total, 92% pretendem priorizar marcas e lojas que ofereçam uma experiência de compra agradável – 44% aceitam pagar a mais por isso. Já 90% afirmam querer priorizar marcas e lojas que ofereçam praticidade na hora de receber ou levar a compra – 38% aceitam pagar mais por isso.
  • O mercado da maioria dá preferência a pagamentos descomplicados. No dia a dia, os meios mais utilizados são Pix (66%), cartão de crédito (61%) e dinheiro (47%). 

2. O policonsumidor: reinventando a experiência de compra

  • Na era “phygital”, a linha entre o on-line e o off-line se dissolve, fundindo as duas realidades e criando experiências de compra integradas, multidimensionais e fluidas. Para o varejo, resta o desafio de reinventar a experiência de compra para oferecer o melhor ao policonsumidor, que navega entre os dois mundos. Os dados da pesquisa refletem um consumidor das classes C, D e E não apenas mais conectado, mas também mais consciente dos riscos e benefícios dessa conexão.
  • Mesmo com a crescente imersão digital, comprar em lojas físicas ainda é a experiência mais frequente entre as classes C, D e E na maioria das categorias de produtos, mas a compra de artigos eletrônicos e cursos já é feita predominantemente on-line.
  • A loja física continuará a existir e está se reinventando para oferecer experiências mais envolventes e personalizadas. É essencial entender profundamente as preferências e necessidades dos consumidores, adaptando-se para satisfazê-los de maneira eficaz. Por exemplo, as lojas precisarão incorporar cada vez mais recursos digitais em seus espaços.
  • Além da estética, o atendimento, a segurança e a capacidade de criar uma conexão genuína são cruciais para atrair e reter clientes de baixa renda. Em um mundo globalizado, 82% preferem lojas brasileiras, demonstrando uma forte identificação com a cultura local.
  • Os consumidores do mercado da maioria estão abertos a inovações que os ajudem a tomar decisões de compra mais informadas. No entanto, é essencial equilibrar a inovação com a privacidade – 62% preferem estabelecimentos que não solicitem muitos dados pessoais. A personalização baseada em comportamento on-line, sem exigir dados explícitos, pode ser uma solução.
  • Em um cenário de fusão das realidades física e digital, o atendimento humanizado e capaz de gerar identificação segue como um fator importante para os consumidores de baixa renda em contraposição à impessoalidade da tecnologia.
  • O crescimento do segmento cross-border (uma combinação de varejistas locais, nacionais e internacionais) é impulsionado pela busca dos consumidores por variedade de produtos, produção sob demanda, praticidade nas compras, preços competitivos e uma experiência personalizada graças à gamificação e à algoritimização proporcionada pelos players cross-border.

3. Um consumidor com propósito: engajamento e coletivização das preferências de consumo

  • Os consumidores do mercado da maioria, apesar de suas limitações financeiras, estão atentos às causas defendidas pelas marcas. Eles valorizam a sustentabilidade e estão dispostos a apoiar empresas que se envolvem em causas sociais e ambientais. No total, 86% estão dispostos a priorizar marcas e lojas sustentáveis e 60% estão mais preocupados com o impacto de suas ações no meio ambiente.
  • A disposição do consumidor do mercado da maioria para pagar mais quando a compra envolve causas valorizadas por ele expressa a demanda latente por responsabilidade socioambiental. No total, 70% se declaram dispostos a pagar mais por marcas que apoiem causas ambientais e 69% se declaram dispostos a pagar mais por marcas que apoiem causas sociais. Por outro lado, 52% já abandonaram marcas que desrespeitaram o meio ambiente e 53% já deixaram de comprar marcas por falta de responsabilidade social.

4. Um consumidor da verdade: o poder das conexões autênticas

  • As diversidades regionais e étnico-raciais da população brasileira se intensificam na base da pirâmide. A população negra representa 62% do mercado da maioria (classes C, D e E) e 35% do mercado da minoria (classes A e B).
  • Dada a vastidão e diversidade do Brasil, é fundamental que as empresas reconheçam e valorizem as particularidades de cada região para estabelecer conexões genuínas. Ao desenvolver produtos e campanhas de marketing, é crucial também considerar as características demográficas, como a predominância de jovens ou de determinados grupos étnicos.
  • Os consumidores agora valorizam empresas que não apenas falam, mas agem de maneira inclusiva e genuína. O verdadeiro valor está em produtos e serviços que refletem as mudanças sociais e em marcas que apoiam causas alinhadas aos valores e identidades de seus consumidores.
  • A cocriação e a participação ativa se tornaram oportunidades valiosas para estabelecer conexões mais profundas entre as marcas e seu público.
  • Existe uma demanda latente entre os consumidores por marcas e lojas comprometidas com a promoção e valorização da diversidade. O estudo aponta que 50% já deixaram de comprar um produto ou contratar serviços de alguma marca que teve atitudes consideradas preconceituosas. 

5. Um consumidor investidor: a nova arena circular do consumo

  • Os influenciadores digitais avaliam, testam e detalham os benefícios de itens específicos, muitas vezes suprindo uma lacuna deixada pelas próprias marcas. Eles não apenas afetam decisões de compra, mas algumas vezes se tornam vendedores de suas próprias marcas.
  • Os consumidores também estão entrando na arena de vendas, oferecendo produtos de segunda mão de marcas renomadas a preços mais acessíveis. Isso cria uma economia circular, que permite a mais pessoas ter acesso a produtos de qualidade e gerar uma nova fonte de renda para elas. No total, 40% dos consumidores (44 milhões) já compraram produtos em redes sociais e 38% (42 milhões) já compraram itens usados em sites/apps especializados.
  • A gamificação está emergindo como uma estratégia-chave para enfrentar a proliferação de plataformas de venda on-line e a crescente influência digital. Ela pode ajudar a rentabilizar o consumo, com marcas oferecendo recompensas e descontos em troca de engajamento dos consumidores em atividades que lembram jogos em suas plataformas.
  • As estratégias inovadoras de rentabilização do consumo representam para o mercado da maioria uma forma moderna de superar as limitações financeiras tradicionalmente impostas a esse grupo da população. No entanto, isso não diminui a importância da ampliação do acesso ao crédito que as marcas e lojas podem oferecer a esse consumidor para expandir oportunidades de negócios.

Roteiro estratégico para as empresas

Propomos o seguinte roteiro estratégico para as empresas varejistas voltadas para o mercado da maioria melhorarem seu posicionamento para atender às necessidades e desejos das classes C, D e E, criando relações relevantes e duradouras:

  • Quantificar o potencial de mercado para essa população.
  • Rever a estratégia de go to market.
  • Estudar novos tipos de produtos e cadeias de distribuição.
  • Rever pricing e políticas de crédito.
  • Oferecer interações que tenham uma conexão emocional com o consumidor, evocando sentimentos e criando um senso de pertencimento. Seja por meio de personalização, inovações impulsionadas pela inteligência artificial, conveniência ou atendimento excepcional, o foco está em tornar cada interação especial e significativa.
  • Investir em lojas-conceito que reforcem a identidade da marca.
  • Integrar experiências on-line e off-line, criando um ambiente “phygital”.
  • Investir em profissionais na loja que representem os consumidores e que conheçam bem os produtos.
  • Engajar-se genuinamente em práticas sustentáveis e responsáveis, tanto em termos ambientais quanto sociais.
  • Renovar seu portfólio de produtos e serviços nas dimensões ambiental e social.
  • Comunicar claramente esses esforços e práticas ao consumidor.
  • Adotar estratégias como o consumo circular.
  • Oferecer opções de parcelamento e ampliar o acesso ao crédito, considerando as preferências de pagamento dessas classes.
  • Estar atualizado com as tendências de pagamento, como alternativas móveis e carteiras digitais, e implementá-las quando apropriado.
  • Colaborar com influenciadores digitais que desenvolvam uma conexão genuína com essas classes.
  • Ampliar os canais de comunicação com os consumidores para entender suas preocupações, feedbacks e sugestões.
  • Usar esse feedback para aprimorar sua estratégia e execução continuamente, adaptando-se às mudanças nas necessidades e nos desejos dessas classes.

“Os brasileiros das classes C, D e E têm características e comportamentos diferentes em comparação com o que era visto alguns anos atrás. São novas demandas e nuances regionais que precisam ser consideradas pelas organizações. A reflexão que queremos provocar vai além da experiência do consumidor. Queremos incentivar os líderes a se perguntar se suas estratégias e execução são realmente adequadas para atender a essa população, levando em consideração fatores econômicos, variações culturais e questões ESG a que esses consumidores estão cada vez mais atentos.”

Luciana Medeiros,sócia e líder da indústria de Consumo e Varejo da PwC Brasil
Luciana Medeiros
Renato Meirelles

“Nosso foco é o mercado da maioria, dos consumidores no meio e na base da pirâmide econômica, que tiveram que se reinventar em busca de equilíbrio financeiro e controle de despesas. São pessoas ainda mais seletivas, com mais experiência e acesso à informação e a mais opções de compras e canais. É um cenário que está impulsionando uma abordagem mais criteriosa na avaliação do custo-benefício, combinando uma exigência de qualidade e preço acessível, com uma atenção especial aos aspectos ESG.”

Renato Meirelles,presidente do Instituto Locomotiva

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Luciana Medeiros

Luciana Medeiros

Sócia e líder da indústria de Consumo e Varejo, PwC Brasil

Tel: 4004 8000

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