Novembro 9, 2021.
Por Marina Salles
O Intensive Connection — principal programa de potencialização de startups do AgTech Garage desenvolvido em parceria com seis grandes companhias do agronegócio — acabou de encerrar mais um ciclo, dando o pontapé em dez projetos inovadores. Os projetos são resultado dos desafios propostos pelas companhias, que junto do Agtech Garage selecionaram 12 startups, duas cada, para cooperar e construir soluções colaborativas com o ecossistema.
Os projetos da multinacional alemã Bayer giram em torno da capacitação de profissionais nas fazendas por meio de novas metodologias de aprendizado; os da trading americana Bunge são voltados: um à rastreabilidade dos grãos, para fortalecer a transparência ao longo da cadeia produtiva e outro à análise preditiva de compras; enquanto o projeto da francesa de saúde animal Ceva se relaciona com a conexão e fidelização de clientes.
A marroquina de fertilizantes OCP, por sua vez, escolheu focar na customização de soluções em nutrição de plantas e fertilidade do solo; ao passo que a brasileira de papel e celulose Suzano veio apostar na geração de valor para a restauração florestal e o Sicredi se debruçou sobre o empoderamento do produtor rural através de tecnologias, tanto de gestão financeira como de gestão produtiva.
Henrique Provenzano, coordenador dos Programas de Inovação Aberta do AgTech Garage, conta que o número de inscrições para o Intensive Connection mais do que dobrou na edição deste ano em relação à do ano anterior, chegando a 210 startups inscritas. A seletiva foi aberta, pela primeira vez, a ag&food techs de toda a América Latina e 20% das inscrições vieram de fora do Brasil.
“Estamos na nossa terceira edição do Intensive Connection e, cada vez mais, percebemos a maturidade do ecossistema de inovação no agronegócio, que o AgTech Garage ajudou a construir. As startups estão chegando mais preparadas e as empresas também, o que potencializa as oportunidades de negócio entre elas”, diz Provenzano.
José Tomé, CEO do AgTech Garage, afirma que esse é apenas o começo de uma jornada exponencial de cooperação. “Nós consideramos que esses seis meses de duração do Intensive Connection foram uma fase de namoro, preparatória para as startups e corporates operacionalizarem seus projetos e darem escala para as soluções. É gratificante ver os resultados do que nasceu em tão pouco tempo e com tanto esforço da nossa comunidade, que é altamente qualificada e engajada”, diz.
Com uma rede de mais de 850 startups e mais de 2 mil profissionais do agronegócio conectados — incluindo executivos, investidores, produtores rurais e membros da Academia — o hub protagoniza com seus parceiros uma nova dinâmica da inovação no setor.
Para a Bayer, a jornada ao lado da Já entendi e My Farm Agro foi inteiramente focada na capacitação dos produtores rurais, visando: a geração de valor para o agricultor; auxílio na formação de pessoal no agronegócio; facilitação na adoção do Climate FieldView (plataforma de agricultura digital da Bayer) e potencialização dos resultados de soluções da empresa, como a recém-lançada tecnologia Intacta 2 Xtend®. “Não adianta nada ter as melhores tecnologias se as pessoas não estiverem preparadas para usá-las. Nosso desafio é ajudar os agricultores brasileiros e suas equipes a se prepararem para a adoção e uso do máximo potencial das novas tecnologias digitais aplicadas à agricultura”, afirma Bernardo Coelho, líder de Customer Experience Strategy da Bayer para América Latina.
Gladys Mariotto, CEO da Já Entendi, explica que a metodologia de ensino da startup é baseada na sua tese de doutorado sobre neurociência e cognição, que foi atrás de descobrir como o cérebro funciona para produzir conteúdos de fácil absorção. O público da empreendedora são pessoas com dificuldade de aprendizado ou baixa escolaridade e, ao lado da Bayer, a Já Entendi está construindo materiais associados ao Climate Field View.
Na My Farm Agro, conhecida no mercado com o Netflix do setor, Antonio Carlos Jorge, diretor executivo e fundador da startup, está trabalhando em conteúdos de apoio à adoção da tecnologia Intacta 2 Xtend®, oferecendo uma ferramenta de streaming no agro para produtores entenderem melhor os produtos e serviços que utilizam, além de proporcionar uma experiência divertida que pode garantir a melhor gestão, produtividade e segurança na ponta da cadeia.
O momento, nos dois casos, é de finalização dos projetos piloto, que serão avaliados sob os critérios de: entendimento da usabilidade dos produtos, satisfação do cliente e nível de aprendizado. “Foram mais de 160 startups inscritas nesse desafio, muitas delas de recursos humanos, e foi super bacana o engajamento que a gente teve e como conseguimos avançar nesse tema que, a princípio, estava fora da zona de conforto do AgTech Garage”, diz Coelho.
Focada em apresentar ao mercado soluções da porteira para fora em sua estreia no Intensive Connection, a Bunge trabalhou em duas frentes: rastreabilidade na cadeia de grãos, com a AgTrace; e uso de dados para apoiar suas decisões de compra, com a Manfing. “Nossa grande motivação para integrar o Intensive Connection é a transformação digital da empresa e as duas iniciativas no âmbito do projeto demonstram isso ao abordarem temas que são centrais para a companhia”, afirma Braian Souto, Gerente de Projetos Estratégicos da Bunge.
O projeto conjunto entre a Bunge e a AgTrace estuda a implantação de tecnologia blockchain para integrar e ampliar a visibilidade da rastreabilidade nas cadeias de grãos e oleaginosas da empresa no Brasil. “Quando se fala em rastreabilidade em uma cadeia como a de grãos não adianta olhar só para uma área da empresa. A Bunge tem essa visão e, desde o início, envolveram as mais diversas equipes para pensarmos no projeto juntos", conta Andre Turkienicz, CEO da AgTrace.
No projeto junto à Manfing, a Bunge desafiou a startup, que é dona de uma plataforma de inteligência de dados para vendas, a pensar em uma solução voltada a apoiar o processo de compras. “Percebemos muita disposição da equipe comercial da Bunge em nos ajudar a entender o negócio deles, tirar dúvidas e validar informações para entregarmos um projeto verdadeiramente útil no dia a dia da companhia'', afirma Leandro Volanick, CTO da Manfing.
Também estreante no Intensive Connection, a empresa francesa Ceva Saúde Animal vem trabalhando ao longo dos últimos seis meses com as startups E-ctare e Pecsmart, a partir de sua nova célula de inovação no AgTech Garage, a Ceva Insights. Com a E-ctare, uma plataforma financeira de antecipação de recebíveis, a Ceva desenhou os moldes de um projeto na área de crédito. Enquanto com a Pecsmart, de gestão inteligente da produção animal com internet das coisas (IoT), está em fase avançada de um Mínimo Produto Viável (MVP) para aprofundar a conexão e fidelização de seus clientes.
Fernanda Viscione, Gerente de Marketing de Pecuária e Líder responsável pela Ceva Insights, afirma que o projeto com a Pecsmart aplica tecnologias e soluções com foco na sanidade e bem-estar animal para garantir a eficiência da gestão do rebanho e fidelização dos clientes, na medida em que a leitura e identificação dos animais se dá de maneira ainda mais prática. “A parceria abriu horizontes para projetos totalmente novos para nós, em áreas que nós nem vislumbrávamos quando entramos no programa”, diz Diego Kurtz, fundador da Pecsmart.
Com a alta liderança engajada, principalmente na figura do Diretor Geral no Brasil, Giankleber Diniz, a empresa francesa também aproveitou a participação no Intensive Connection para envolver diferentes áreas da companhia no processo de inovação. Ao todo, mais de dez projetos estão rodando paralelamente na empresa por conta do programa com o AgTech Garage.
Já o tema da marroquina OCP foi o da customização de soluções em nutrição de plantas e fertilidade do solo, que ativou as startups Sensix e Krilltech, aprovadas em uma rodada de pitches inclusive em inglês, para interagir com as lideranças globais da companhia. Segundo Franciele Trentini, Coordenadora da Vertical de Inovação da OCP no Brasil, depois de mais de 30 horas de reuniões, envolvimento de cinco times internos da OCP nacionais e internacionais (de Estruturação e Execução; Agronômico; Marketing; Vendas; Comunicação e P&D) e mentorias das startups com vice-presidentes, o grupo desenhou seus objetivos.
A fim de tornar a produção agrícola cada vez mais sustentável, a OCP vem estruturando com a Krilltech uma Prova de Conceito (POC) de uma bio-solução apresentada com foco na fertilização fosfatada. Já com a Sensix, a OCP busca estruturar indicadores de saúde do solo e nutrição de plantas que garantam uma aplicação otimizada de fertilizantes impactando positivamente a performance do produtor rural.
Thomaz Lemos, Diretor de Operações da Sensix, conta que a agtech tem um sistema de gestão de dados para a agricultura (que reúne imagens de drones associadas às de satélites e maquinários) no qual é possível cruzar mapas de produtividade e fertilidade do solo, por exemplo, para demonstrar o impacto de cada nutriente no desenvolvimento das plantas. Em sua segunda participação no IC, a Sensix está entusiasmada: “O Intensive Connection marca o início de grandes parcerias entre startups e empresas gigantes, foi assim para a Sensix com a Bayer e está sendo assim com a OCP”, afirma.
No caso da Krilltech, o foco dos trabalhos é na busca por bio-soluções de ponta para a agricultura tropical, que empregue a nanotecnologia em fertilizantes. Hoje, a Krilltech já dispõe de uma partícula orgânica rica em carbono, nitrogênio e oxigênio chamada arbolina, que entrega para o produtor aumento de qualidade e produtividade da safra, seja de soja ou morango, e eleva a resistência das plantas a estresses bióticos e abióticos. “Não é fácil sair de uma universidade e empreender e a interação com a OCP tem sido bastante enriquecedora nesse sentido”, afirma Carime Silva Rodrigues, CTO da Krilltech e doutora pela Universidade de Brasília, que desenvolveu a arbolina em parceria com a Embrapa.
Nesta edição do programa, a Suzano selecionou as startups AMtech ePlantem para buscar formas de gerar valor com a restauração florestal e promoveu, junto com o AgTech Garage, uma oportunidade ímpar de co-criação de uma solução, integrando as duas agtechs, que identificaram sinergias para novos negócios e fontes de receita. Rodolfo Garuba, da Suzano, explica que o propósito da Suzano é renovar a vida a partir da árvore nos 2,2 milhões de hectares em que atua, dos quais 975 mil hectares são de áreas protegidas, e que, para isso, é preciso ouvir a floresta. “Escutar o que a árvore tem a nos dizer, esse é o mote do nosso projeto, que deu origem ao Net Nature”, diz.
O Net Nature é uma solução tecnológica que criará a conexão entre a floresta e o escritório a partir do monitoramento de informações a campo, para valorizar o “capital natural” sob responsabilidade da Suzano. De um lado, a AMTech traz o aparato tecnológico, que vai desde a inteligência artificial e Data Lake, para trazer o que está na floresta para dentro do computador. Enquanto, de outro, a Plantem aporta seu conhecimento biológico aplicado para saber qual sensor usar, que dado medir ou levantar em bases públicas. Nos próximos 45 dias, a expectativa é que a solução mínima viável esteja pronta para rodar no campo.
“Para nós, é muito importante ter um atalho para dialogar com empresas do porte da Suzano, que têm um desafio real e a demanda de ouvir as florestas para comunicar suas ações para a sociedade”, afirma Mario Azevedo, co-fundador da Plantem. “Pela abertura que a gente teve no Intensive Connection, conseguimos apresentar uma solução única co-criada pelas três empresas, o que é surpreendente”, emenda Marcos Raso, da AMTech.
Parceiro antigo do AgTech Garage, o Sicredi veio para sua terceira edição do Intensive Connection com foco em promover um conjunto de soluções voltadas à gestão financeira do produtor rural, planejamento de safra e controle e manejo de pragas e doenças, após a consulta a 1 mil produtores rurais, das mais de 100 cooperativas que integram o Sicredi. As startups selecionadas foram a Connect Farm, especializada na integração de dados agronômicos, e a Lucro Rural, que oferece soluções financeiras para o gerenciamento de fazendas.
Segundo Luis Veit, Superintendente de Agronegócios do Sicredi, o alinhamento de expectativas da instituição financeira cooperativa com as duas agtechs foi bastante fluido como nas edições anteriores e, até aqui, a parceria com o AgTech Garage já gerou, somente considerando projetos piloto, benefício para 338 produtores, em 32 mil hectares com 2 mil animais. Entre a primeira e a terceira edição do IC, 219 startups se inscreveram para cooperar com o Sicredi e seis foram selecionadas.
Com a Lucro Rural, o piloto está sendo desenvolvido com 23 produtores de 3 cooperativas em 5,9 mil hectares no Sul do país. Já a Connect Farm está em contato permanente com 12 produtores rurais de 6 cooperativas em 460 hectares de terras. “O programa contribui muito para a estratégia do Sicredi de ofertar soluções além do crédito ao produtor rural e, ao mesmo tempo, estarmos engajados no processo de inovação”, diz Veit.
Ângelo Ozelame, co-fundador da Lucro Rural destaca a geração de valor do Intensive Connection para os seus negócios: “Está sendo uma experiência fantástica. O Sicredi soube selecionar os produtores para trazer vários perfis para dentro do projeto, do pequeno ao grande, da agricultura à pecuária, para entendermos sua aderência à tecnologia”, diz. A gama de associados da instituição financeira cooperativa é um dos pontos de maior interesse também para a Connect Farm, de acordo com o CEO Rodrigo Dias. “A gente vê um potencial enorme de ganho em nos conectarmos com pequenos agricultores. Chama a atenção como o Sicredi leva conhecimento e assistência técnica agronômica de forma simples e direta para esse público.”