Janeiro 21, 2022
Por André Luis Vian
A tecnologia e a agricultura sempre andaram juntas. E, nos últimos anos, a digitalização, por meio da inteligência artificial, das máquinas inteligentes, dos softwares e do sensoriamento remoto das plantas e do solo vêm mudando a forma como enxergamos as lavouras.
No caso do sensoriamento remoto, o primeiro grande passo foi o ganho de eficiência na amostragem das plantas, que entrega informações de forma muito mais rápida ao produtor do que o método convencional e agiliza sua tomada de decisão. Mas a “bola da vez” é, de fato, a visão panorâmica dos atributos de solo proporcionada pelo sensoriamento remoto, que a distância revela as características químicas, físicas e biológicas dos solos com aptidão agrícola.
Isto quer dizer que o envio de amostras para os laboratórios está com os dias contados? Longe disso, mas significa sim que os agricultores têm novas ferramentas à disposição para auxiliá-los e vamos entender, abaixo, porque vale a pena lançar mão delas.
O sensoriamento remoto (SR) vem sendo estudado desde os anos de 1970 com o emprego para avaliação da produção e da área plantada com o uso da constelação de satélites Landsat. O pesquisador Edison Crepani, em 1983, definiu o sensoriamento remoto como sendo a ciência de obtenção de informações sobre um alvo, objeto, área ou fenômeno graças aos dados coletados por equipamentos denominados de sensores, que não entram em contato direto com o que está sendo avaliado.
Os sensores são hardwares com capacidade de mensurar uma característica física ou química do alvo de interesse via a reflectância da radiação eletromagnética (REM).
Seu principal ganho em relação à coleta de solo tradicional é a obtenção de resultados qualitativos e quantitativos de forma rápida e com um número de pontos amostrais por área muito maior.
Um aspecto importante que devemos considerar é que como os sensores realizam estimativas das informações dos alvos que estamos estudando precisamos ter modelos matemáticos ajustados aos atributos e regiões que estamos trabalhando para estimar adequadamente os teores considerando a determinação laboratorial. Vale dizer que as estimativas nem sempre apresentam altos valores de correlação, porém, que esta limitação é compensada pela alta taxa de amostragem que o sensor realiza.
O sensoriamento remoto é definido pela radiação eletromagnética (REM) que indica a reflectância de radiação do objeto (planta e solo), sendo dividida em faixas: visível, infravermelho próximo e infravermelho médio, compreendendo a reflectância entre 400 até 2600 nanômetros (nm). Há ainda alguns sensores que utilizam comprimentos de onda maiores, expressos em milímetros (micro-ondas) ou em centímetros (ondas de rádio) e os termais (emissão de calor).
Na Figura 1, pode-se observar o comportamento espectral específico da vegetação e do solo. Enquanto a vegetação apresenta uma resposta na reflectância nas regiões do visível (VIS) e no infravermelho próximo (NIR), o solo possui uma maior reflectância na região do infravermelho próximo e médio (NIR - MIR).
As diferenças no comportamento espectral de solos com diferentes concentrações de argila, silte e areia e com diferentes teores dos nutrientes podem ser estimados nessa região do espectro.
Esquema do comportamento da reflectância espectral entre a vegetação e o solo (Fonte: Adaptado de Souza Filho, 2004)
Os sensores podem ser de vários tipos considerando quatro características: operacional, do tipo de avaliação, energia e inferência.
Em relação ao operacional, podem ser móveis (utilizados em tratores e demais veículos) ou estáticos/fixos (para uso em bancadas de laboratório ou na propriedade).
A segunda característica é importante, pois diz respeito ao tipo de avaliação que o sensor realiza, podendo ser invasiva (realizada por sensores que são acoplados a veículos e fazem leituras de forma óptica ou por resistividade) ou não-invasiva (realizada por sensores proximais ou orbitais).
A partir do tipo de energia que os sensores utilizam, eles podem ser classificados ainda como passivos (que usam a radiação solar como fonte de energia) ou ativos (com energia própria).
Por fim, o resultado gerado por eles pode ser indireto ou direto. No indireto, a informação precisa ser calibrada e validada, para que se estime a concentração dos atributos avaliados. Na direita, os sensores trazem o resultado pronto.
Características dos sensores proximais de solo
Do ponto de vista dos princípios de funcionamento, baseados na reflectância ou em outros processos físicos, os sensores são divididos em: ópticos (como raio gama, raio x, visível, infravermelho), micro-ondas e com funcionamento por ondas de rádio, além dos sensores elétricos, eletroquímicos e mecânicos. Ainda estão em pleno desenvolvimento os sensores ópticos nas regiões (VIS - NIR - MIR), os quais são ferramentas com grande potencial de uso para a estimativa de inúmeros atributos dos solos. A técnica mais utilizada é a de espectrometria, por meio da emissão de energia por um sensor e um receptor que capta a reflectância da amostra.
Características físicas de funcionalidade dos sensores de solo
O método tradicional atualmente é a coleta de amostras que podem seguir diferentes formas e metodologias de coleta na lavoura, acondicionamento em embalagem específica e envio aos laboratórios credenciados. A média dos valores cobrados para realizar uma análise completa é de R$ 80 a 90.
Outro aspecto é a que a amostra é processada por metodologias e padrões que exigem procedimentos químicos e a utilização de uma série de produtos (ácidos e bases) que precisam ser descartados com cuidado para não gerar contaminação ambiental.
A alternativa é realizar a estimativa dos atributos químicos do solo em tempo real no campo, sem a necessidade de envio de um grande volume de solos para os laboratórios. Além disso, essa nova metodologia é uma alternativa que permitirá uma maior velocidade na obtenção dos resultados, redução de custo e uma redução do uso de produtos químicos em laboratório, que podem ser prejudiciais ao meio ambiente.
- Sensores de Condutividade elétrica do solo
A condutividade elétrica do solo é medida por meio da resistividade da corrente elétrica, que quando induzida no solo o percorre de duas formas: contínua (na solução do solo) e superficial (via superfície das suas partículas).
A condutividade elétrica aparente do solo (CEa) é uma informação do potencial elétrico do solo que, por sua vez, é influenciado pela concentração de óxidos de ferro do solo, umidade e pela textura do solo (areia + argila).
Como podemos ver na figura abaixo, a Condutividade elétrica (Ce) tem alta relação com a umidade do solo (água) e com o teor de argila do solo correlacionado com a variabilidade espacial e temporal. Teoricamente, nas regiões onde há menores teores de argila poderá haver uma menor condição de formação de macro e microporos, consequentemente uma menor quantidade de água armazenada ocasionando uma redução da Ce.
Condutividade elétrica do solo por contato e relação com água do solo, textura do solo considerando a variabilidade espacial e temporal (Fonte: Adaptado de Molin & Faulin, 2013).
Pode-se quantificar a condutividade elétrica do solo de duas formas, por contato ou por indução eletromagnética. Na imagem a seguir (Figura 5), são apresentadas as relações entre a condutividade aparente do solo (CEa) com os teores de areia e argila.
Para estimar os teores de areia observa-se que conforme o aumento da CEa menor é o teor de areia, pois o aumento do teor de areia provoca a redução da CEa em função da areia não ser um material com alta capacidade de condução de eletricidade.
Quando se estimou os teores de argila por meio da CEa, encontrou-se uma relação positiva com o aumento dos teores de argila em função do material de formação e de composição da argila, sendo esses materiais geralmente de origem ferrosos que são bons condutores de energia elétrica.
Modelo matemático para a estimativa dos teores de areia e argila usando a condutividade elétrica aparente do solo (CEa) em três lavouras comerciais em Campo Verde (MT). Os pontos em azul nos mapas são os locais de realização da amostragem e determinação laboratorial (Fonte: Adaptado de Borba et al., 2015)
Os sensores mecânicos, por sua vez, são os mais utilizados na agricultura. E podemos dizer que o sensor de resistência à penetração do solo foi o primeiro sensor utilizado.
Os sensores são compostos por hastes que realizam leituras compactação do solo em função da resistência que o solo tem à penetração, geralmente as leituras são realizadas no perfil do solo em profundidades de até 40 cm, com variação na resolução espectral podendo ser de 5 em 5 cm ou 10 em 10 cm, por exemplo.
São inúmeras as variações de montagem desses sensores, sendo montados em quadriciclos, tratores, outros veículos e até sendo utilizado de forma simples, sem ser embarcado.
A principal informação que este sensor fornece ao produtor e técnicos é a condição física do solo ou da lavoura, que remete se o solo está compactado ou não e permite inferir quais práticas de manejo devem ser realizadas.
Esse sensor não substitui por completo outras análises, como a de densidade do solo com anéis volumétricos e taxa de infiltração de água no solo, mas gera dados associativos, que corroboram com as informações.
O comportamento espectral de solos é dependente de suas características físicas, químicas e biológicas. Utilizando técnicas de sensoriamento remoto, é possível obter informações de maneira rápida, precisa e não destrutiva no campo.
Existem inúmeros modelos que estimulam os atributos químicos do solo. Porém, algumas metodologias ainda estão distantes do produtor rural em função do custo inicial alto para implantação ou de dificuldades impostas pelo campo, como pedregosidade, compactação, palha, entre outros.
O grande desafio do diagnóstico de atributos físicos, químicos e biológicos do solo é conseguir realizar uma grande quantidade de amostras na área, por meio da eletrônica, computação, automação e ciência de dados, fazendo com que os sensores detectem uma ampla variabilidade espacial dos atributos.
Lembrando que os sensores de solo não substitui 100% a análise laboratorial por duas funções: não temos sensores desenvolvidos para estimar todos os atributos de solo que precisamos e os sensores que já foram desenvolvidos precisam ser calibrados para diferentes tipos de solo, regiões brasileiras, atributos entre outros. Assim, os dados são complementares entre si.
BORBA, M. Z.; FREDDI, O. da S.; TREVISAN, R. G.; EITELWEIN, M .T.; MOLIN, J. P. Condutividade elétrica aparente no mapeamento da textura do solo. In:__ XXXV Congresso Brasileiro de Ciência do Solo. Natal, 2015.
MOLIN, J. P.; FAULIN, G. D. C. Spatial and temporal variability of soil electrical conductivity related to soil moisture. Scientia Agricola, v. 70, n. 1, p. 1–5, 2013.
SOUZA FILHO, C. R.. Sensoriamento Remoto Hiperespectral. Infogeo, Curitiba PR, v. 33, p. 32-36, 2004.
André Luis Vian é professor do Departamento de Plantas de Lavoura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Agrônomo com mestrado em Fitotecnia, ênfase em fisiologia e manejo de plantas. Doutor em Fitotecnia, com ênfase em sistema de produção vegetal.
Tem experiência também na área de manejo e ecofisiologia das espécies produtoras de grãos. Sua linha de pesquisa versa sobre os seguintes temas: sensoriamento remoto na agricultura, ecofisiologia e manejo de plantas de lavoura, adubação nitrogenada em taxa variável em cereais, uso do nitrogênio pelas plantas e agricultura de precisão.
*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor e não refletem necessariamente a visão do Agtech Innovation News.